As Cartas que Escrevi para Você – Capítulo 33

Era fim de tarde quando Clara encontrou a pequena caixa de madeira, escondida sob o assoalho da sala secreta. A tampa estava lacrada com uma fita vermelha desbotada, selada com cera partida. Havia nela um símbolo que Clara já vira em sonhos, um círculo incompleto com uma linha que o atravessava, como um eclipse interrompido.

Com mãos hesitantes, que pareciam reconhecer o gesto antes mesmo da consciência, ela quebrou o selo. Dentro da caixa, uma dezena de cartas cuidadosamente dobradas, todas escritas com tinta azul, a mesma cor das palavras no diário de Elias. Mas o que a fez recuar, confusa, foi o reconhecimento imediato da caligrafia: era a sua.

Cada letra, cada curva, era indiscutivelmente sua. Mas Clara não se lembrava de ter escrito nada daquilo.

Abriu a primeira carta. O papel exalava um perfume sutil, antigo, como flores secas e livros esquecidos. Leu em silêncio, o coração apertando a cada linha:

“Elias, escrevo como quem sonha acordada. Sei que o tempo não nos pertence mais, mas ainda assim sinto teu nome respirando entre minhas costelas. Tuas mãos continuam me chamando em silêncio, mesmo quando estou acordada. Talvez não devêssemos ter aberto o espelho. Talvez já estivéssemos abertos antes.”
— Com amor eterno, L.

Clara levou a mão à boca. As palavras não eram apenas familiares, eram íntimas, como se tivessem nascido de um sentimento guardado dentro dela há muito mais tempo do que sua vida podia contar.

As cartas seguintes eram igualmente intensas. Falavam de encontros em sonhos, de memórias que escorriam pelas frestas do tempo, de arrependimentos que pareciam não ser dela… mas também pareciam.

E todas eram assinadas com a mesma inicial: L.

Lisbeth?

Ou… Clara?

Era como se, em alguma dobra secreta do tempo, as duas fossem uma. Como se ela estivesse revivendo não apenas as memórias de Elias, mas também as de quem o amou profundamente, e nunca pôde alcançá-lo por completo.

Ali, com as cartas espalhadas ao redor e a tarde desbotando pela janela empoeirada, Clara compreendeu que sua ligação com Elias não era apenas uma busca. Era um reencontro.

Mas reencontro de quem com quem?

Essa pergunta agora ardia mais do que todas as outras. E as respostas, Clara sentia, estavam escritas não apenas nas cartas — mas nas entrelinhas do que ela ainda não se permitira lembrar.

As Cartas que Escrevi para Você – Capítulo 33