A Caixa com Fotos Antigas – Capítulo 38

Era dia de arrumação no Reino de Veramor. Um daqueles em que a poeira sobe dos cantos, os móveis deslizam e os armários revelam segredos esquecidos. A Rainha, com lenço no cabelo e mãos ágeis, puxou uma caixa esquecida sob a escada. O Rei, curioso como sempre, aproximou-se devagar, já com aquele olhar que misturava desejo e ternura.

Abriram juntos. Lá dentro, um punhado de lembranças dormia em silêncio: fotos antigas, cartas dobradas, ingressos de lugares onde juraram se amar mais do que antes. Eles estavam ali, sorrindo em versões mais jovens, menos cansadas, mas talvez menos plenas.

Ela pegou uma foto em que usava um vestido leve, cabelos soltos ao vento. Olhou para ele com olhos provocantes e perguntou, como quem lança um feitiço de doçura:
— Eu ainda te provoco assim?

O Rei sorriu devagar, passando os dedos no papel desgastado.
— Você me provoca muito mais. Porque agora eu sei o gosto da tua pele depois da chuva, o som do teu suspiro antes de dormir, e a forma como teu silêncio me chama sem dizer palavra.

Ela corou. Não por timidez, mas por saber que ele dizia a verdade.
Ele puxou outra foto, em que estavam lado a lado, mãos quase se tocando. Aproximou-se da Rainha, agora tão perto que o cheiro de sabão e passado dela o atingia como perfume novo.
— Envelhecer contigo é como caminhar num campo onde cada flor nasceu do que já vivemos. Não há ruga que me assuste quando sei que cada uma foi escrita a dois.

Ela encostou o rosto no ombro dele.
— E ainda assim, você me olha como se eu tivesse acabado de chegar.

Os dois se sentaram no chão, no meio da bagunça, rindo de roupas antigas, se admirando como se o tempo não tivesse passado. Os cães se acomodaram perto. Os gatos dormiam no sofá. E naquela tarde cinzenta, enquanto a casa cheirava a madeira e memória, o amor parecia mais vivo do que nunca.
Porque algumas caixas, quando abertas, devolvem mais que lembranças. Devolvem o desejo de continuar a história.

A Caixa com Fotos Antigas – Capítulo 38