A Fuga, o Sol e a Volta do Amor em Festa – Adendo VII

A manhã amanheceu bonita, mas carregava um presságio estranho. O céu, embora azul, parecia segurar um suspiro no ar. Os pássaros cantavam, mas a canção parecia interrompida por um compasso de inquietação.

Foi só ao terminar o café que perceberam a ausência. Um dos cães, o mais traquinas, o mais aventureiro, havia desaparecido.

A Rainha Vera sentiu um aperto no peito antes mesmo de confirmar o que já intuía. O Rei correu o jardim com olhos aflitos, os gatos miavam inquietos, e o outro cão rondava a porta como se tentasse entender para onde fora seu irmão de aventuras.

A busca começou sem demora. Percorreram cada canto do Reino de Veramor, chamando pelo nome com a voz embargada de medo. O Rei atravessou até os limites da cidade, parou transeuntes, mostrou fotos no celular, perguntou a feirantes, a vizinhos, a desconhecidos. A Rainha, com um mapa da propriedade na mão, vasculhou cantos onde o sol quase não chegava, com olhos marejados e coração apertado.

E nesse silêncio de saudade, o amor entre eles só crescia. Em cada troca de olhar, havia consolo. Em cada toque rápido, havia força. E mesmo no desespero, o Rei não deixava de sussurrar frases que, mesmo ofegantes, ainda tentavam arrancar um sorriso da Rainha:

Te encontrar triste é como ver o sol tentando brilhar debaixo d’água. Ainda assim, teu brilho não me abandona, minha Deusa.

A tarde chegou dourada, mas o Reino seguia em sombra… até que, no meio do quintal, como se nada tivesse acontecido, lá vinha ele. O fujão. Língua pra fora, rabo abanando, passos leves como quem volta de uma breve caminhada ao paraíso. Nem um arranhão. Nem um pedido de desculpas. Só a cara de pau canina mais cativante do mundo.

A Rainha caiu de joelhos, os braços abertos, e o cão se jogou em seu colo como se voltasse para o ninho. O Rei chegou logo atrás, ainda ofegante, e abraçou os dois, os olhos molhados não só de alívio, mas de amor transbordante.

E ali, naquela cena quase cômica, o amor reencontrou seu riso.

A tarde seguiu com festa. Os gatos ronronaram aos pés da Rainha. O outro cachorro latiu de felicidade até cansar e deitar por cima das anotações da horta. O fujão, bem… ele dormiu no sofá real, com a barriga para cima e a alma em paz.

E no calor daquele reencontro, o Rei voltou a ser verbo e toque. Beijou o ombro da Rainha enquanto ela cortava frutas, segurou-lhe a cintura com a naturalidade de quem sabe o próprio lugar no mundo. E murmurou, como se o sol tivesse escolhido aquele momento para ouvir:

Se teu abraço fosse um lugar, eu me mudaria pra dentro dele e só sairia pra te buscar flores.

Ela sorriu, com aquele olhar que acende. Aproximou-se, passou os dedos por entre os cabelos dele e disse baixinho:

E se tua boca fosse estação, eu te esperaria até o fim do inverno só pra ver meu verão começar.

E naquele instante, o Reino de Veramor não tinha mais perdas, nem medos, nem buscas. Só reencontros, risos, pelagens misturadas no tapete da sala e dois corações que sabiam, com certeza absoluta, que amar é isso: perder o fôlego de vez em quando, mas nunca perder um ao outro.

A Fuga, o Sol e a Volta do Amor em Festa – Adendo VII