✦ A Receita da Ternura – Capítulo 6

Na esquina mais ensolarada do bairro antigo, há uma padaria de janelas largas e cheiro constante de forno aceso. As paredes são de tijolos expostos e, acima da porta, uma placa escrita à mão diz: “Aqui, pão quente e coração leve”.

Quem passa por ali cedo sente o aroma do alecrim antes mesmo de ver a fachada. É Lara quem comanda o lugar. Jovem, de olhos doces e cabelos presos com um lenço florido, ela chega antes do sol nascer. Coloca música suave, acende algumas velas e começa a preparar a massa com movimentos que mais parecem orações silenciosas.

A receita que usa não está em livros. Foi passada de avó para neta por meio de sussurros e abraços. Mistura farinha, água morna e fermento com um punhado de alecrim colhido à noite, quando a planta está mais aberta ao mundo invisível. Em vez de sal, um suspiro de ternura. Em vez de conservantes, lembranças boas.

Os fregueses chegam com o rosto abatido e os ombros tensos. Há quem venha por luto, outros por solidão ou apenas por aquele cansaço que não se explica. Mas basta comer uma fatia daquele pão macio e dourado, ainda fumegante, para algo se alinhar por dentro. Um choro contido escapa, uma risada surge do nada, um “obrigado” sai mais sincero.

Lara nunca pergunta o que aflige. Apenas oferece o pão, um chá e um olhar que acolhe sem julgar. Quando perguntam como consegue fazer um alimento tão especial, ela apenas sorri e diz que é tudo culpa do alecrim. Mas quem observa com atenção vê que, enquanto amassa, os olhos dela brilham como se ouvisse segredos bons sendo revelados.

E há algo curioso: ninguém sai de lá com as mãos vazias. Mesmo que não compre nada, sempre recebe um pão pequeno, embrulhado em tecido claro, com um bilhete preso por barbante: “Leve isso para quem precisa lembrar que ainda há afeto no mundo”.

E assim, todos os dias, a padaria da Lara aquece mais que o estômago. Aquece o que quase ninguém vê. O que mora dentro.

A Receita da Ternura – Capítulo 6