✦ A Senhora das Conchas Vivas – Capítulo 13

A maré subia lentamente quando Maíra alcançou a praia velada pelas brumas. O cheiro do sal e das algas se misturava ao aroma suave de algo mais antigo, quase impossível de nomear. Ali, o vento parecia sussurrar em outro idioma, como se contasse segredos a quem soubesse escutar com o coração.

A areia era fina como farinha, pontilhada por pequenas conchas vivas que se moviam lentamente, deixando rastros em espiral. Cada concha tinha uma coloração diferente, como se trouxessem dentro de si fragmentos de céu, rio e luar. E entre todas aquelas presenças minúsculas e encantadas, uma figura surgiu — uma mulher de cabelos compridos como correntes marítimas, a pele marcada pelo tempo e pela maresia. Seus olhos, de um castanho profundo e líquido, pareciam conter o reflexo de todas as luas cheias que já nasceram sobre o mar.

Ela não falou. Apenas fez um gesto com os dedos, pedindo silêncio. Maíra compreendeu. A Senhora das Conchas Vivas caminhou até uma pedra plana, onde um tear antigo repousava entre redes e fios úmidos de orvalho marinho. Ali, ela tecia. E o que tecia era diferente de tudo que Maíra já vira: mantos feitos com conchas que, mesmo costuradas, ainda sussurravam. Vozes suaves escapavam dos pontos entrelaçados, contando histórias esquecidas por todos, menos por elas.

A mulher pegou um dos mantos e o estendeu diante de Maíra. Nele, estavam bordadas cenas de um passado ancestral: uma criança sendo ungida à beira de um rio dourado, uma guardiã abrindo a boca do tempo com um cântico, uma linhagem inteira protegendo uma luz viva em meio às águas.

Com um gesto, a Senhora das Conchas indicou que aquele manto era para Maíra. Quando o tecido tocou sua pele, ela sentiu as vozes entrarem em seu peito como se sempre estivessem lá. Era como vestir as histórias da sua própria alma, como se, finalmente, todas as suas dúvidas tivessem um lugar para repousar.

As conchas sussurraram o último fio de um destino que se tecia há gerações. Maíra entendeu que aquele era o momento de retornar. Tudo o que precisava para a jornada final estava consigo agora: a melodia, a coragem, o saber antigo e, acima de tudo, o pertencimento.

Antes de partir, a Senhora das Conchas tocou suavemente o ombro de Maíra e sorriu com ternura. Então, virou-se de volta ao tear, retomando seu trabalho com um ritmo que parecia seguir o compasso das marés.

A neblina começou a fechar a paisagem novamente. Maíra caminhou pela areia úmida, sentindo cada passo como uma confirmação. Estava pronta. O rio a esperava.

A Senhora das Conchas Vivas – Capítulo 13