🜨 O Arquivo das Lamentações – Capítulo XXX

O templo ergue-se nas margens do mundo, onde o tempo hesita e a memória sangra. Suas paredes, feitas de pedra viva, choram sem cessar lágrimas negras que escorrem como tinta antiga, gravando na matéria o peso de milênios de luto. Cada gota é uma história esquecida, sufocada, enterrada por quem não suportou recordar.

Liora atravessa o umbral com os ouvidos abertos e o coração em ruínas. O silêncio ali é falso: ele vibra com ecos, soluços, palavras interrompidas. O chão pulsa sob seus pés com as vozes de crianças que nunca cresceram, amores silenciados, promessas partidas. Ela caminha entre corredores onde o ar pesa como chumbo, e cada lamento sussurrado exige ser ouvido, julgado, lembrado.

Ela não tem como acolher todos. Nem todos os gritos podem voltar à superfície. E no entanto, se não forem ouvidos, jamais cessarão.

No altar central, há uma urna de vidro que nunca reflete o que está fora, apenas o que está dentro de quem olha. Liora a encara. Lá, vê seus próprios erros, os silêncios que preferiu manter, as vozes que ignorou. E entende: parte do Arquivo é ela.

Ela começa a escutar. Não para consolar. Mas para que a dor tenha forma. Para que o que foi esquecido não se perca — mas se transforme.

“Lamentar é lembrar que ainda se sente.”

O Arquivo das Lamentações – Capítulo XXX