O Cansaço que Não Impediu o Abraço – Capítulo 37

O dia foi longo no Reino de Veramor. Reformas na ala oeste, contas para fechar, pedidos para a feira, um susto com a torneira da cozinha que decidiu jorrar por conta própria. Os cães estavam eufóricos desde cedo, como se fossem guardiões do caos, e os dois gatinhos encontraram nos cadernos da Rainha um ninho perfeito para a soneca da tarde. Havia lama na entrada, sacolas espalhadas, meias órfãs e panelas que não se lavariam sozinhas. A casa parecia um retrato fiel do que sentiam: exaustos, inteiros, vivos.

A Rainha, mesmo rendida pelo cansaço, tirou os sapatos devagar e caminhou até o sofá com aquele jeito que misturava elegância natural e preguiça encantadora. O Rei já a esperava ali, com uma manta jogada nas pernas e o olhar fixo nela como se não existisse mais nada entre o início e o fim do dia.

Ela se deitou ao lado dele, encaixando-se como quem volta ao lugar certo, e o silêncio que se fez foi denso, carregado de tudo o que ainda não tinham dito naquele dia. As mãos se encontraram devagar, como se se procurassem por instinto. E então ela disse, com um sorriso de canto, já com a cabeça no peito dele:

Hoje até minha pele está cansada, mas ainda te deseja como quem acabou de te descobrir.

O Rei sorriu, passando os dedos pelos cabelos dela com lentidão, e respondeu como quem provoca sem pressa:

E eu, mesmo sem força, ainda teria fôlego pra me perder em ti até adormecer.

O cansaço continuava ali. A louça não lavada também. Mas nada disso parecia urgente diante do abraço que selava a noite. Porque no Reino de Veramor, quando os corpos não têm mais energia, as almas continuam querendo se encontrar. E se há um lugar para repousar o mundo, é nos braços um do outro.

O Cansaço que Não Impediu o Abraço – Capítulo 37