O Guarda-Roupa que Ninguém Monta – Capítulo 50

O dia começou com promessas práticas: montar o novo guarda-roupa real. As peças chegaram desmontadas, os manuais em mais de uma língua, as ferramentas misteriosamente ausentes. O Rei tentou seguir as instruções com paciência e dignidade, enquanto a Rainha Vera analisava o caos com aquele ar de quem enxerga além dos parafusos.

Horas depois, só havia uma porta de pé e três parafusos rodando sobre o chão. Um dos gatos dormia dentro de uma das gavetas vazias, e o cachorro maior carregava uma tábua pelo jardim como se fosse troféu.

A Rainha, com os cabelos soltos e um vestido que dançava ao menor vento, cruzou as pernas sobre o tapete da sala e se jogou para trás, rindo do próprio cansaço.

— “Prefiro desmontar teu juízo do que montar esse troço,” disse ela com a voz baixa, os olhos cheios de travessura e um sorriso que tinha gosto de pecado nobre.

O Rei largou a chave de fenda, caminhou até ela com um ar fingidamente indignado e a puxou suavemente para o colo. Os dois gatos observaram, como quem já sabia o rumo daquela cena. O outro cachorro latiu para uma abelha e foi ignorado solenemente.

— “Esquece o móvel,” ele sussurrou perto do pescoço dela. “Vamos montar só o que realmente importa.”

Ela se aconchegou, embriagando o ar com o perfume da pele quente de fim de tarde.

— “E o que importa agora, meu Rei?”

Ele encostou a testa na dela, como quem encontra abrigo.

— “Empilhar beijos, encaixar nossos risos e forrar nosso descanso com teu corpo por cima do meu.”

Ali, entre pregos, manuais e bichinhos sonolentos, o Reino de Veramor provava mais uma vez que os móveis da paixão nunca vêm com manual. Mas sempre se montam com toque, olhar e aquele tipo de encaixe que só eles dois sabiam fazer.

O Guarda-Roupa que Ninguém Monta – Capítulo 50