Capítulo Adendo – O Peso da Coroa (E da Marreta)

No suntuoso e encantado Reino de Veramor, nem tudo são beijos ao pôr do sol, nem juras sussurradas sob a luz da lareira. Há dias, e muitos, em que o que impera é o som do martelo, o pó de parede no ar e o barulho inconfundível de um cano estourando bem no meio da poesia.

A Rainha, de mãos firmes e olhar determinado, fiscaliza a obra como quem comanda um exército. Ora segura a planilha de gastos, ora o esfregão. Já o Rei, este mesmo que escreve versos ardentes e suspira à toa, está com as mãos cheias de cal, subindo escada, raspando mofo das paredes e tentando entender por que uma simples goteira virou uma cachoeira mitológica.

Porque o Reino de Veramor, para permanecer em pé, exige bem mais do que amor e metáforas. Há o encanamento antigo que insiste em lembrar que o tempo passa, o reboco que descola como se dissesse “poesia não segura parede”, e o jardim… ah, o jardim, que precisa de água, poda e paciência.

No pomar, o Rei e a Rainha lutam com as formigas. Na horta, tentam convencer a rúcula a crescer reta e orgulhosa. E no fim do dia, o que resta é um cansaço tão legítimo que o desejo se acomoda num cantinho, dizendo: “hoje não, minha realeza… só amanhã, quem sabe”.

Mas mesmo exaustos, cobertos de tinta e terra, há algo que não se quebra: o pacto silencioso de dois corpos que trabalham lado a lado para que o Reino de Veramor exista, resista e floresça,  mesmo que o flerte precise entrar na fila, depois do rejunte, da massa corrida e do banho quente que nunca vem.

Afinal, amar também é suar. E às vezes, a sedução mora no balde de água sanitária, e o romance, na troca de olhares cúmplices no meio da bagunça.

No fim, o Rei ainda tenta ousar um sussurro:
“Minha Rainha, se não for hoje, prometo que amanhã você terá não só os muros secos… mas também meu fogo reacendido.”

E ela, com um sorriso torto e olheiras reais, responde:
“Só se você lavar a louça.”

Capítulo Adendo – O Peso da Coroa (E da Marreta)

Brasão Reino de Veramor

V&R
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