O Primeiro Conflito

Clara passou dias obcecada pela ideia de confirmar se Rafael realmente existia. As cartas, tão vívidas e detalhadas, já não eram suficientes para calar a dúvida. Na pequena cidade ao pé da montanha, buscou em arquivos antigos, folheou jornais amarelados pelo tempo, percorreu registros empoeirados da biblioteca municipal. A cada página, a ansiedade se misturava ao medo de descobrir algo que não queria.

Foi em um recorte de jornal, datado de 2003, que encontrou o nome dele. Rafael M. Dias. A notícia era breve, quase indiferente: mencionava um acidente em estrada nevada, a apenas alguns quilômetros da casa. O coração de Clara se fechou em um nó de angústia. Estaria ela escrevendo para alguém já morto? Seria tudo uma ilusão criada por sua mente fragilizada pelo luto?

De volta à casa, segurou o papel entre as mãos como se fosse prova e sentença ao mesmo tempo. A lareira ardia, mas não conseguia aquecê-la.

Na sexta-feira seguinte, quando a carta de Rafael apareceu na varanda, ela a abriu com hesitação. As palavras dele não falavam de morte, mas de pressentimentos. Relatava sonhos estranhos, uma sensação de estar vivendo algo que não poderia explicar. Confessava que às vezes, ao acordar, sentia que sua vida estava suspensa em uma linha tênue entre realidade e devaneio.

Clara leu e releu até que as lágrimas borraram a tinta. O abalo da descoberta a fazia oscilar entre o medo e o desejo de continuar. A casa parecia respirar as dúvidas com ela, como se as paredes soubessem mais do que revelavam.