✦ O Relógio que Pausa – Capítulo 39

Na penumbra tranquila de uma ruazinha antiga, quase esquecida pelos apressados da cidade, havia uma vitrine pequena, de moldura entalhada à mão, onde um velho relógio de madeira batia as horas com uma cadência que não seguia o tempo comum. Era ali que morava a bruxa-relojoeira, uma mulher de olhos profundos e dedos hábeis que compreendia mais de silêncios do que de segundos.

Ela não vendia relógios, apesar da loja estar cheia deles. Também não os consertava de forma comum. Seus relógios tinham corações pulsantes e ouvidos atentos. Cada um era criado para encontrar alguém específico, mesmo que a pessoa ainda nem soubesse que precisava dele. A bruxa não revelava nomes, apenas sorria quando o relógio certo se acendia com um brilho miúdo ao passar de um visitante.

Esses artefatos mágicos tinham a estranha capacidade de parar o tempo. Não o tempo externo, dos compromissos e filas, mas o tempo interno, aquele que sufoca dentro do peito quando tudo parece demais. Quando alguém, sem aviso, era tocado por uma dor funda, uma memória intensa ou um vazio sem nome, o relógio pulsava e, por poucos segundos sagrados, tudo se aquietava por dentro.

Era como se o ar ganhasse um peso reconfortante, como se os pensamentos cessassem sua corrida e o mundo respirasse junto. As mãos suadas se acalmavam. O choro preso encontrava saída. As perguntas sem resposta deixavam de gritar. A pausa não era percebida por ninguém ao redor, mas para quem a vivia, era como se tivessem recebido um colo do tempo.

Certa vez, uma moça entrou carregando um cansaço nos olhos que nem a juventude conseguia disfarçar. A bruxa não perguntou nada. Apenas entregou a ela um pequeno relógio de pulso, com uma correia feita de fibras azuis e um ponteiro que tremia levemente. A moça olhou, estranhou, mas sentiu um calor subir pela palma da mão. Saiu da loja sem saber explicar o porquê das lágrimas que caíram logo depois.

Naquela noite, o relógio parou por sete segundos. Tempo suficiente para ela perceber que não precisava ser forte o tempo todo.

E assim a bruxa continuava, criando pausas em forma de engrenagens. Porque ela sabia que às vezes, o que mais salva alguém, não é uma resposta, mas o simples direito de parar. Nem que seja por alguns segundos ao dia.