✦ O Vento que Escuta

Ao entardecer, quando a luz dourada começa a se dissolver na penumbra dos campos, ela desperta. Não com pressa, nem com alarde. Apenas se ergue. Seus pés descalços tocam a terra ainda morna do dia e, com um gesto silencioso, começa a caminhar.

Essa mulher é conhecida apenas por alguns como “a bruxa dos campos”. Mas não a temem. Respeitam-na. Há quem diga que ela nasceu do vento e se alimenta de segredos. Outros juram que é só uma mulher antiga, com ouvidos aguçados e coração leve. Mas o que poucos sabem é que ela escuta o que ninguém mais escuta.

Enquanto caminha entre as lavandas e os capins altos, ela ergue o rosto. Fecha os olhos. O vento, leve e inquieto, sussurra pelas janelas entreabertas das casas ao redor. Ele traz sussurros de mães cansadas, de amantes em silêncio, de crianças que sonham e de velhos que não dormem. Traz dúvidas, pedidos mudos, desejos sufocados.

Ela não força a escuta. Apenas se abre. Deixa que o vento passe por ela como se fosse parte do seu corpo. Cada palavra não dita, cada sentimento contido, chega até ela como um sussurro no ouvido. E ela compreende. Não com a razão, mas com a alma.

Depois, sem nada prometer, ela responde. Mas não com palavras. Ela sopra de volta. Uma brisa leve, quase imperceptível, atravessa os mesmos campos, alcança as mesmas janelas e toca aqueles que, de alguma forma, pediram algo. A resposta vem como uma intuição. Uma ideia súbita. Um alívio no peito. Uma lágrima que escorre sem dor.

Ninguém nunca viu essa bruxa escrever uma carta ou erguer uma varinha. Sua magia está no silêncio, na escuta e na delicadeza com que transforma os ventos em mensagens. Às vezes, ela planta sementes no caminho, outras vezes deixa uma pena presa entre galhos, como sinal de que ouviu. Há noites em que acende uma única vela no alto da colina, e a luz dança como um sim sagrado.

E quando o dia seguinte nasce, ninguém sabe ao certo o que aconteceu. Só sentem. Um pouco de paz inexplicável. Um pensamento que acalma. Um nó que se desfaz. Tudo porque, em algum lugar entre o mundo visível e o invisível, o vento encontrou quem o escutasse. E essa bruxa, antiga como a terra e sutil como o ar, cumpriu mais uma vez seu papel: ouvir o mundo e devolvê-lo mais leve.