Revelações do Passado

A tarde estava fria quando Clara decidiu arrumar a estante da sala. Entre livros antigos e empoeirados, herdados dos antigos donos da casa, um volume encadernado em couro chamou sua atenção. Ao abri-lo, uma pequena folha amarelada deslizou até o chão. Era um bilhete, dobrado com delicadeza, escrito em uma caligrafia que ela reconheceu imediatamente.

As letras eram as mesmas das cartas. O mesmo traço firme, a mesma inclinação ligeiramente melancólica. As palavras eram simples: “Para quem vier depois de mim, que esta casa ainda possa abrigar corações cansados.” O bilhete parecia ter dormido ali por décadas, preservado entre as páginas como uma mensagem destinada a atravessar o tempo.

O coração de Clara acelerou. Aquilo era mais do que coincidência. Era a primeira prova concreta de que Rafael realmente existira, de que suas cartas não eram apenas fruto de uma imaginação tomada pela solidão.

Na carta seguinte, ela contou o que encontrara. Narrou o momento, descreveu o livro, mencionou o tom exato do papel e o cheiro de mofo que o tempo imprimira nele. Quando a resposta chegou, Rafael confirmou. Disse lembrar-se de ter deixado aquele bilhete anos antes, em um inverno de 1999, quando pensava em vender a casa, mas acabou desistindo.

A revelação abalou Clara. O tempo, até então uma muralha intransponível, começava a mostrar suas fissuras. Era como se as linhas entre o passado e o presente se movessem, abrindo brechas por onde o impossível se tornava palpável. A casa, testemunha silenciosa de dois invernos, parecia agora respirar junto com eles, guardando em suas paredes a prova viva de que o amor podia atravessar os séculos.