🌿 Capítulo I – Elira: Guardiã da Memória (Elemento: Terra)

No sopé da Montanha da Nascença, onde as pedras guardam calor mesmo sob a neve, nasceu Elira, a primeira a despertar. Sua mãe morreu ao dar-lhe a vida. Dizem que foi um pacto, pois nenhuma alma mortal resistiria ao peso que Elira traria consigo: a lembrança de todas.

Desde pequena, Elira escutava as vozes que ecoavam pelas cavernas. Vozes antigas, enterradas sob camadas de silêncio, vinham em sonhos ou tremores no solo. Aos sete anos, aprendeu a distinguir os sussurros da Terra dos sussurros da loucura. Aos nove, já registrava nomes de mulheres há muito esquecidas em folhas de casca de freixo, usando uma tinta feita de raízes moídas e sal.

A floresta à sua volta era viva — e a reconhecia como filha. Troncos se inclinavam quando ela passava, não por submissão, mas por respeito. Animais a observavam sem fugir. Sombras se retraíam diante de sua presença. E sempre, sempre que uma alma feminina era apagada da história por mãos alheias, seu nome ecoava até Elira, que o plantava entre as raízes da montanha.

Elira era a memória viva da linhagem silenciada.

Guardava:

• os cantos proibidos: melodias de parto, de morte e de renascimento.
• os mapas celestes esquecidos: desenhados em pedras lisas, com carvão e musgo, marcando conjunções antigas que só voltariam em eras futuras.
• os nomes das mortas: centenas deles, murmurados toda manhã para que jamais se apagassem.

Certa noite, durante um eclipse que enegreceu a neve, Elira ouviu uma canção que não conhecia. A melodia não vinha da Terra, nem do céu, nem das árvores. Vinha de dentro.

Sentou-se em frente ao Lago da Névoa, onde as águas não fazem som. Na lama da margem, desenhou oito espirais interligadas com seus dedos cobertos de argila e sangue menstrual. Murmurou os nomes, um a um, como uma oferenda. E quando terminou, a água se ergueu como vapor, girando no ar, e em cada ponto do círculo formado pela névoa, uma presença respondeu.

As outras estavam vindo.

“Enquanto houver memória, haverá magia.”

A Terra vibrou. O tempo mudou. O Círculo estava recomeçando.

🌿 Capítulo I – Elira: Guardiã da Memória (Elemento: Terra) – Continua