🜏 A Traição das Três – Capítulo IX

Na calada da noite, sob as ruínas do antigo bosque das promessas partidas, as Sem-Nome reuniram-se novamente. Lys acendia brasas com os olhos, Morien mantinha o olhar atento ao céu em busca de presságios, e Adaeze… estava estranhamente silenciosa. O chão parecia estremecer sob seus pés, como se algo — ou alguém — se arrastasse sob a terra, roçando as pedras em um ritmo que só ela compreendia.

Desde que o eco de Elariah se espalhara entre sonhos e sombras, todas sentiam que algo se aproximava. Mas Adaeze havia ido além. Isolava-se, sussurrava para a escuridão, respondia a perguntas que ninguém fazia. Quando voltou do Vale Rachado, seus olhos já não refletiam a mesma luz.

— Temos que desfazer os votos antes que eles se tornem algemas — dizia Lys.

— Ou criar novos caminhos, se quisermos sobreviver à fenda — completava Morien.

Mas Adaeze, em silêncio, apenas sorria. Não como quem encontra uma resposta. Mas como quem já selou um destino.

O que as outras não sabiam é que Adaeze ouvira algo. Uma voz que não vinha da Terra, nem do Sonho, nem de Elariah. Algo mais antigo que o próprio Círculo. Uma presença que se identificava apenas como Aquela que Espera do Lado de Dentro.

Foi durante uma vigília solitária junto à Fenda que a voz a tocou. Não pediu nada. Apenas sussurrou um segredo impossível de carregar: o Círculo nunca foi completo. Algo ficou de fora. Algo necessário. Algo sombrio.

Desde então, Adaeze passou a crer que a nova ordem mágica estava incompleta. Que a liberdade das Sem-Nome era uma ilusão — uma nova gaiola com tintas de rebeldia. E assim, ela fez o que nenhuma bruxa deveria fazer: entregou o nome de cada nova iniciada para Aquela que Espera. Um por um. Em troca, recebeu poder. Mas também um fardo: ser a chave de um despertar que talvez engula tudo.

Na noite do ritual das Três Luas, quando as Sem-Nome tentariam selar um novo pacto de equilíbrio, Adaeze desapareceu. No altar, restou apenas uma inscrição feita em sangue de dragoneira:

“Nem todo Caos é desordem. Às vezes, é estrutura que vocês não podem compreender.”

E naquele instante, Morien compreendeu. Lys caiu de joelhos.

A traição não viera de fora. Sempre esteve entre elas.

E enquanto as estrelas se apagavam, o novo Círculo começava a ruir por dentro.

Citação:
“A verdadeira ruína não vem da guerra. Vem daquilo que acreditamos ser lealdade.”

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