🜨 O Espelho das Culpas – Capítulo XV

Não havia mapas que apontassem para aquele lugar. Só o arrependimento sabia o caminho.

Entre ruínas esquecidas, soterradas sob séculos de musgo e silêncio, repousava o Espelho das Culpas, uma relíquia há muito exilada do mundo das bruxas. Ele não refletia imagens. Refletia verdades. E nenhuma delas era suportável.

Foi Liora quem o encontrou, guiada por visões que não eram suas. As pedras em volta do espelho murmuravam nomes extintos, segredos que apodreceram calados. Era um objeto sem moldura, sem superfície, mas diante dele, toda máscara caía.

A primeira a olhar viu a si mesma aos gritos, afogada em decisões não ditas. A segunda viu todas as vidas que poderia ter salvo se não tivesse hesitado. A terceira… apenas virou-se e correu, sem jamais dizer o que viu.

O Espelho não castiga. Ele revela.
E a revelação, por si só, é punição suficiente.

Dizia-se que o espelho foi forjado com a água da última lágrima de uma deusa traída, e polido com a culpa de suas filhas. Por isso, jamais pode ser quebrado. Porque culpa não se desfaz: se carrega.

Algumas bruxas ajoelharam-se diante dele. Outras amaldiçoaram os próprios olhos. Uma, apenas uma, sorriu, não por orgulho, mas por ter aceitado, enfim, o que se tornara. Ela saiu em silêncio. E ninguém jamais soube se sobreviveu ou simplesmente se dissolveu em si.

Desde então, o Espelho permanece ali, imóvel, paciente. À espera da próxima que ouse ver mais do que o mundo permite.

Porque há espelhos que embelezam. Outros que deformam.
E há o Espelho das Culpas que revela o que sempre esteve lá.

“Há verdades que nem o tempo ousa apagar.”

O Espelho das Culpas – Capítulo XV