O Véu Rasgado – Capítulo 11
“Quando as mãos se encontram, o véu se rompe. O toque é a memória despertando.”

A vertigem foi como um redemoinho interno, um silêncio que rugia. Quando Clara abriu os olhos, o sótão parecia o mesmo, mas não era. O ar estava mais leve, e ao mesmo tempo carregado de algo antigo e pulsante. Ela se levantou devagar. Tudo estava… deslocado.

O espelho, antes manchado e empoeirado, agora reluzia como vidro recém polido. Os objetos ao redor, livros, pincéis, molduras, estavam organizados de forma diferente. Não como se tivessem sido largados às pressas, mas arranjados com cuidado, como se alguém conhecesse profundamente aquele espaço.

Clara notou pegadas no chão, sobre o pó ralo que restava: marcas recentes, como se alguém tivesse estado ali poucos minutos antes. Sentiu a pele se arrepiar.

Caminhou até o espelho, hesitante. O reflexo a encarava com olhos que pareciam mais antigos. Por um instante, viu algo por trás de si: um vulto, um contorno, talvez uma presença. Virou-se rapidamente. Nada.

No chão, onde antes havia o caderno com os desenhos, agora havia apenas um pedaço de papel dobrado. Com mãos trêmulas, Clara o abriu:

“Quando as mãos se encontram, o véu se rompe.
O toque é a memória despertando.
Você viu o que não era para ser perdido.
Agora, olhe mais fundo.”

Sem entender por completo, ela olhou novamente para o espelho. E então aconteceu.

No reflexo, o sótão se transformava lentamente. As paredes voltavam a exibir quadros terminados. O cavalete já não abrigava um quadro inacabado, mas uma tela viva, vibrante, onde duas mãos, uma masculina, outra feminina, se tocavam. A mesma imagem do último caderno. Ao fundo, entre sombras, a silhueta de Elias.

Ele não parecia ver Clara, mas pintava com dedicação obsessiva. Murmurava palavras inaudíveis, até que, em certo momento, parou, ergueu os olhos na direção do espelho, como se a visse, e sorriu com tristeza. Seus lábios se moveram:

“Você lembra agora?”

Clara recuou um passo. O reflexo voltou ao normal. O sótão, novamente quieto.

Mas algo dentro dela se rearranjava. Não era apenas ela que estava desvendando o passado. O passado, também, a estava encontrando.

Talvez o tempo tivesse menos a ver com relógios do que com memórias que insistem em voltar quando tocam a alma certa.

O Véu Rasgado – Capítulo 11