A Lembrança Desenhada – Capítulo 30

Clara acordou com o som de seu próprio lápis riscando o papel. Estava sentada à escrivaninha, olhos ainda turvos pelo sono, a mão direita concluindo os traços de uma paisagem que não reconhecia, um campo vasto, margeado por árvores torcidas como mãos em súplica, com uma cabana solitária ao fundo, cujas janelas pareciam olhos. O traço era firme, quase automático, como se não fosse dela.

Deixou o desenho sobre a mesa e desceu para tentar se recompor, mas o incômodo persistia. A imagem permanecia gravada em sua mente, vívida demais para ser apenas um sonho. Mais tarde, guiada por uma inquietação surda, Clara subiu ao sótão, lugar que evitava desde que encontrara ali o quadro rasgado de Elias.

A madeira rangeu sob seus pés. O ar estava mais frio que o habitual, como se o sótão respirasse devagar. Vasculhou entre molduras cobertas por panos e móveis antigos até que parou, imóvel. Ali, pregado na parede encardida, estava o mesmo desenho do seu sonho. Cada linha, cada sombra, idênticos.

Mas havia mais: no canto inferior direito, a assinatura de Elias. E uma data, o dia anterior.

O coração de Clara disparou. Ela tocou o papel, que estava levemente úmido, como se tivesse sido finalizado há pouco. O nome de Elias parecia pulsar sob os dedos.

Era impossível. E, ao mesmo tempo, totalmente coerente com tudo o que vinha acontecendo.

Aquilo não era apenas uma conexão espiritual. Era uma linha viva, emaranhada entre o tempo dela e o tempo dele. Aquele campo existia, ou ainda existiria. Aquela cabana talvez fosse o próximo lugar onde Clara encontraria respostas, ou onde Elias teria deixado a última pergunta.

E agora, mais do que nunca, ela sabia: não estava apenas seguindo rastros. Estava sendo guiada.

A Lembrança Desenhada – Capítulo 30