O Reencontro – Capítulo 54

O lugar não tinha nome, nem paredes, nem chão. Não havia céu acima, nem sombras ao redor. Era uma camada de tempo onde tudo permanecia em suspensão. Nada começava, nada terminava. Apenas era. O tempo ali não se movia em linha, mas em presença. Existia como um campo calmo onde tudo que precisava acontecer já havia acontecido, e ainda assim, acontecia de novo, em paz.

Clara e Elias estavam sentados diante de um cavalete. Nenhum deles falava. E não precisavam. O silêncio entre eles não era feito de ausência, mas de plenitude. Compartilhavam uma tranquilidade que não vinha da explicação, mas do reconhecimento mútuo. Eram dois corpos, duas almas, dois gestos e, ao mesmo tempo, uma só consciência desdobrada em duas presenças criadoras.

A tinta em seus dedos não vinha de potes ou tubos. Era feita de memória limpa, de tempo reconciliado. Não tinham pressa. Cada pincelada fluía como se nascesse do próprio gesto de estar ali. As imagens que surgiam não tinham forma definida, mas transmitiam emoção pura. Era como pintar o som de uma risada esquecida, o calor de uma tarde antiga, a sensação de tocar alguém que não se via há séculos.

Não estavam pintando para lembrar.

Estavam pintando o que não precisava mais ser lembrado, porque agora existia. Não era necessário preservar. Era necessário apenas criar. O que um começava, o outro continuava. O que um sugeria com a sombra, o outro completava com luz. Era dança sem música. Era fala sem voz. Era amor sem palavra.

Nenhuma moldura cercava aquela pintura. Nenhum título lhe fora dado. E ainda assim, era a obra mais inteira que já haviam feito. Era a imagem da conclusão. A confirmação de que algo que durante tanto tempo foi ausência agora era presença viva. Um espaço onde o que um dia se perdeu foi encontrado não pelo tempo, mas pela entrega.

Ali, naquele lugar sem ontem nem amanhã, Clara e Elias não eram mais fragmentos de um mesmo eco.

Eram o reencontro completo entre a criação e o criador.

A arte e a alma.

E então, pintaram mais uma vez. Não porque fosse necessário. Mas porque agora era puro prazer existir.

O Reencontro – Capítulo 54