✦ A Festa da Gratidão Silenciosa – Capítulo 29

A clareira se abria em meio à mata como um segredo bem guardado. O chão havia sido coberto com pétalas de girassol e margaridas, formando caminhos circulares que levavam ao centro da celebração. O ar estava carregado com o aroma de frutas maduras, lavanda e pão recém-assado. Desde as primeiras horas do dia, as bruxas haviam chegado em silêncio, carregando cestos de flores, potes de compotas e panos bordados com símbolos antigos. Nenhuma palavra fora dita, como mandava a tradição.

Era o único ritual do ano em que o silêncio não era apenas um gesto, mas a própria linguagem. O silêncio era a oferenda. A ausência de som se tornava presença pura. Os olhos se encontravam com delicadeza, os sorrisos se alongavam em gestos de acolhimento, e os corpos dançavam devagar, como se cada movimento desenhasse no ar a memória de tudo que havia sido conquistado, de tudo que havia sido superado.

A mesa comunitária era um altar de gratidão. Não havia assentos fixos. Todos se revezavam em ciclos tranquilos, sentando, servindo, recolhendo, partilhando. As crianças caminhavam entre os adultos com fitas amarradas aos pulsos, suas cores variando conforme os votos silenciosos que faziam para o novo ciclo. Uma bruxa mais idosa caminhava entre os presentes com um incensário fumegante, e por onde passava, os olhos fechavam como se o perfume despertasse lembranças boas guardadas no fundo do peito.

Ao pôr do sol, o círculo se formava em torno da grande fogueira decorada com folhas secas e cristais. Cada participante colocava ao redor dela um pequeno objeto que representava algo que havia sido recebido com o coração aberto ao longo do ano. Um livro, uma concha, um pedaço de tecido, uma carta dobrada. Não se explicava, não se apontava. O silêncio era confiança. O silêncio era fé.

Não se falava em destino, nem se discutia o que viria depois. Naquela festa, apenas se agradecia. Pela comida partilhada, pelas mãos estendidas, pelos aprendizados que doeram, pelas curas que vieram depois. Pelos encontros improváveis e pelos recomeços necessários. Por tudo que, mesmo em sua pequenez, havia construído algo dentro de cada um.

E assim, sob a luz suave das estrelas que começavam a surgir, a celebração seguia. A dança voltava, os pés descalços tocando a terra com reverência. Ninguém rompia o voto de silêncio. Porque ali, naquela noite bordada de flores e luzes suaves, o silêncio não era ausência. Era gratidão em sua forma mais profunda. Era o reconhecimento mudo de que viver, mesmo nas suas dores, é sempre um presente.

A Festa da Gratidão Silenciosa – Capítulo 29