O Retrato Inacabado – Capítulo 9

Lucas sentou-se diante da tela, como já havia feito antes, sentindo o peso da memória cair sobre seus ombros. A sala estava impregnada do cheiro de tinta e da delicadeza suspensa do silêncio. Helena, com o pincel nas mãos, observava o retrato inacabado como se ele fosse uma janela para algo que jamais deveria ser totalmente revelado.

Ele tentou sorrir, forçando leveza nas palavras, pedindo que ela retomasse a pintura. Sua voz era quase um sussurro, misturando súplica e esperança. Queria ver-se completo nas mãos dela, queria que aquela obra tivesse fim, como se assim pudesse prender no quadro um pedaço de eternidade.

Helena desviou o olhar, e seus olhos se perderam em algum ponto distante que só ela parecia enxergar. Disse com suavidade que algumas coisas não nasceram para a conclusão, que certas imagens ganhavam força justamente no vazio, na ausência, na sugestão do que poderia ser. O retrato inacabado, afirmou, era mais verdadeiro do que qualquer final.

Lucas permaneceu em silêncio, sentindo a contradição dentro de si. Parte dele desejava ser inteiro aos olhos dela, mas outra parte compreendia a profundidade de suas palavras. O quadro, com seus traços interrompidos, revelava mais do que ocultava, tornando-se um espelho imperfeito de tudo o que eles eram e não seriam.

O pincel repousou na mesa, intocado. Helena sorriu, não em vitória, mas em aceitação. Lucas, enfim, percebeu que não era o término da pintura que lhe importava, mas o instante eterno em que ela escolhera deixá-lo suspenso, incompleto, vivo para sempre naquilo que nunca seria acabado.