O Inverno Mais Longo

A neve começou a cair antes do amanhecer, silenciosa e persistente. Clara observava da janela o mundo sendo lentamente engolido por um manto branco. As árvores, os degraus da varanda, o telhado da velha casa — tudo desaparecia sob a espessura do inverno. O isolamento se tornava completo, e o tempo parecia se deter em um instante imóvel.

Naquela sexta-feira, escreveu a Rafael com as mãos trêmulas de frio, descrevendo o peso da solidão e o medo de que a estrada fosse bloqueada. Mencionou o som do vento uivando pelas frestas e a sensação de que a casa respirava com ela, viva e antiga.

Uma semana depois, ao encontrar a carta dele, Clara estremeceu. Rafael narrava o mesmo cenário, com palavras quase idênticas. Falava da mesma nevasca, das mesmas rajadas de vento, da mesma sensação de confinamento. Dizia que parecia ouvir passos na varanda, como se alguém caminhasse sobre a neve fresca.

Por um instante, ela acreditou que o tempo havia se dobrado sobre si mesmo, permitindo que dois invernos se tocassem. O frio que sentia já não vinha apenas da montanha, mas da certeza inquietante de que, em algum ponto entre os anos, eles estavam juntos sob a mesma tempestade.

O inverno daquele ano parecia não ter fim, como se o próprio mundo hesitasse em permitir que o tempo voltasse a fluir.