✦ O Brilho das Ruas Molhadas – Capítulo 31

A chuva cessara há pouco. O ar ainda carregava aquele perfume fresco de terra úmida e folhas lavadas, como se o mundo tivesse sido limpo de suas dores por alguns instantes. A cidade, envolta em nuvens baixas e respingos nos paralelepípedos, permanecia em silêncio, como quem escuta antes de falar. Era nesse instante suspenso que ela surgia.

A bruxa caminhava pelas ruas com a leveza de quem pisa no sagrado. Seus passos deixavam pegadas luminosas, delicadamente prateadas, que se acendiam sobre a calçada ainda úmida. O brilho não vinha de um feitiço espalhafatoso, mas de algo que parecia mais íntimo, como se cada passo dissesse algo que o coração entendia mesmo sem palavras. Um brilho suave, pulsante, como uma promessa sussurrada ao mundo: vai ficar tudo bem.

Ninguém a abordava, mas muitas janelas se entreabriam. Crianças a observavam com olhos curiosos e espantados, enquanto idosos, sentados atrás de vidraças embaçadas, sorriam como quem reencontra uma lembrança antiga. Os cães não latiam, apenas a acompanhavam à distância, como velhos amigos que sabem quando é hora de seguir em silêncio.

Ela passava por vielas esquecidas, onde o cinza predominava, e ali, seus passos desenhavam caminhos que brilhavam como se o céu houvesse descido à terra por um momento. Quem por acaso cruzava seu rastro sentia um calor no peito, uma calma inexplicável, como se algo dentro se reorganizasse, voltasse ao lugar.

As pegadas não duravam muito. Em poucos minutos, o brilho se dissipava, como um sonho ao amanhecer. Mas mesmo depois de apagadas, algo ficava. Um silêncio mais leve, uma esperança quase imperceptível, mas presente. Como se a rua, antes esquecida e fria, agora soubesse que era vista, que alguém passara ali e deixara uma mensagem de cuidado.

Era assim, noite após noite, após a chuva. A bruxa não deixava bilhetes, nem palavras escritas, apenas pegadas que falavam com quem ousasse escutar com o coração. E havia sempre aqueles que, mesmo sem compreender de onde vinha aquela paz repentina, sabiam no fundo: alguém havia deixado uma luz para eles no caminho.

O Brilho das Ruas Molhadas – Capítulo 31