✦  Quando o Rio Escolhe Falar – Capítulo 11

O ar parecia suspenso naquela manhã. O silêncio tinha peso de ouro antigo, e as margens do rio estavam cobertas por uma névoa que se movia lentamente, como se dançasse ao ritmo de um segredo prestes a ser revelado.

Maíra ajoelhou-se junto à água, com as mãos repousando sobre as pedras frias e lisas. O rio não era o mesmo de sempre. Sua superfície estava imóvel, sem correnteza. Nenhum peixe rompia o espelho líquido, nenhuma folha ousava cair. Tudo ao redor aguardava.

O som veio de dentro da água. Não foi um estrondo, nem uma onda. Era uma vibração suave, quase como um canto profundo vindo das raízes da Terra. Maíra não se assustou. Havia esperado por esse momento desde a primeira vez que escutara o nome do rio em sonho, sussurrado por vozes que não pareciam humanas nem esquecidas.

A voz ergueu-se como se atravessasse séculos de silêncio. Não tinha timbre masculino ou feminino. Era água falando como água fala: com ritmo, com memória, com verdade.

Você tem sede de respostas, disse o rio. Mas nem toda sede é para ser saciada. Algumas perguntas precisam apenas ser ouvidas.

Maíra sentiu um arrepio correr pela espinha. O rio não lhe perguntava se ela queria ouvir, apenas se ela estava pronta. Havia uma diferença sutil entre curiosidade e coragem. Ela fechou os olhos e respondeu apenas com um gesto, inclinando a cabeça em silêncio.

A água moveu-se suavemente.

Há muito tempo, disse o rio, homens e mulheres vinham até mim buscando ouro, força, proteção ou perdão. Trouxeram dores, sementes, canções. Alguns me ouviram, outros me cortaram. Mas todos, no fundo, se reconheceram em mim. Porque sou espelho. E quem olha demais para mim, acaba vendo a si mesmo.

Maíra escutava sem tentar entender tudo. Não era uma lição. Era uma lembrança viva, oferecida como um presente.

Você está prestes a cruzar o último limiar. Mas não existe mapa para o que você busca. O que há são caminhos que nascem do que você escolhe sentir. Ouça sua verdade. Não a que repete o mundo, mas a que nasce entre o silêncio e a água.

Uma única lágrima escorreu pelo rosto de Maíra e caiu no rio. A água reagiu com um brilho sutil, como se reconhecesse nela uma irmã de jornada.

Então, o rio silenciou.

A correnteza voltou a correr devagar, a névoa ergueu-se ao encontro do céu e os pássaros retomaram seus cantos tímidos. Maíra permaneceu ali, sem pressa de se levantar. Sabia que o que ouvira ainda ecoaria dentro de si por muito tempo.

Naquele instante, ela não precisava entender tudo. Bastava sentir que o rio tinha falado. E que ela, com todas as incertezas, tinha escolhido escutar.

Quando o Rio Escolhe Falar – Capítulo 11