As Vozes de Ghravem – 🜂 Capítulo XI

Abaixo da terra onde o sol jamais alcança, repousa Ghravem, o sepulcro oculto dos que nunca foram lembrados. Um labirinto de pedra viva, onde o tempo é engolido por fungos que murmuram em línguas extintas e onde os ecos são mais antigos do que a linguagem.

Ali, os salões não guardam apenas ossos. Guardam histórias nunca contadas, promessas quebradas e um tipo de silêncio que pulsa como carne. Nem toda bruxa ousa descer até essas profundezas, pois Ghravem só chama aquelas que já morreram por dentro.

Kaela sentiu a pulsação pela primeira vez em sonho. Não havia luz, apenas a sensação de que algo chamava por ela com uma ternura doentia. As palavras vinham sem som, mas queimavam atrás dos olhos. Ela acordou ofegante, com musgo entre os dedos e uma runa marcada em sua pele — uma que não existia nos registros de Arkaïon.

Seraphine tentou detê-la. Liora suplicou em nome do pacto. Mas Kaela já não era inteiramente Kaela. Uma parte sua — talvez a mais antiga — lembrava de Ghravem. E estava disposta a descer.

Nas cavernas, o ar era grosso e úmido, como se estivesse vivo. As paredes sussurravam em tons dissonantes, costurando frases entrelaçadas em agonia e desejo. Pequenas figuras espreitavam por entre as fendas: criaturas sem rosto, feitas de poeira e culpa. Elas não tocavam Kaela, mas a seguiam, como se já a conhecessem.

No centro de Ghravem, ergue-se o Salão das Primeiras Lágrimas — um templo subterrâneo esculpido no osso de uma entidade esquecida. Ali, repousava o Trono da Boca Partida, um altar de onde emergem as vozes. Nenhuma bruxa jamais sentou ali e saiu a mesma.

Kaela se aproximou. As vozes pararam. Por um instante, o silêncio de Ghravem foi absoluto — e, naquele vazio, algo respirou.

Ela sentou.

E então, as vozes não mais sussurraram. Elas gritaram.

Kaela não voltou sozinha.

Algo — ou alguém — atravessou com ela. Trazido pelas palavras esculpidas na carne do tempo.

“Quando o vazio responde, é porque algo ainda respira nele.”

As Vozes de Ghravem – 🜂 Capítulo XI